POR JAILTON DE CARVALHO / SIMONE
IGLESIAS / LUIZA DAMÉ
05/09/2014 19:27 / ATUALIZADO
05/09/2014 22:57
Paulo Roberto Costa aceitou termos de
acordo de delação premiada e prestou depoimento na PF de Curitiba
Delação premiada: Costa, que teve papel
decisivo em diferentes fases da construção de Abreu e Lima, é ameaça -
Givaldo Barbosa / Agência O Globo
BRASÍLIA — A revelação de parte do
conteúdo dos depoimentos do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa
provocou, nesta sexta-feira à noite, muita tensão nos comitês das campanhas da
presidente Dilma Rousseff (PT) e da ex-senadora Marina Silva (PSB). Numa série
de depoimentos iniciados semana passada, o ex-diretor apontou o envolvimento de
deputados e senadores, governadores e de pelo menos um ministro com os desvios
de dinheiro de contratos da estatal com grandes empresas.
Costa denunciou pelo menos 25 políticos
vinculados a cinco partidos (PT, PMDB, PP, PR e PTB). A maioria é de
parlamentares federais em campanha pela reeleição. Outros ocupam cargos
executivos no governo federal e em governos estaduais. Costa apontou, entre
outros, um “operador do PMDB”, político fluminense, atribuindo-lhe o papel de
intermediário de aliados do governo em negociações com empresas fornecedoras de
bens e serviços à Petrobras. A atuação desse político se estenderia à
distribuição de propinas a partir de contas no exterior.
Costa aceitou fazer acordo de delação
premiada e, desde então, passou a dar detalhes aos procuradores federais sobre
a estrutura de corrupção e lavagem de dinheiro entre políticos e empresas
contratadas pela Petrobras em negócios intermediados pelo doleiro Alberto
Youssef. O ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom),
Thomas Traumann, que viria para o Rio nesta sexta-feira, desistiu da viagem e
permaneceu em Brasília para monitorar os desdobramentos da situação. A
presidente Dilma Rousseff e o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil), por sua
vez, reuniram-se à noite no Palácio da Alvorada.
— A crise é séria — desabafou um
assessor do Planalto.
Em São Paulo, o comando da campanha de
Marina convocou nesta sexta-feira uma reunião de última hora. Assessores e
colaboradores chegaram ao comitê da candidata sem esconder um certo clima de
tensão. Marina, que inicialmente não participaria do encontro, chegou ao local
depois do vazamento de informações sobre a delação premiada de Costa.
Oficialmente, o assunto da reunião seria a estratégia para rebater ataques dos
adversários. No partido, chegou-se a prever que Marina poderá cancelar
compromissos de campanha no fim de semana.
Ao final da reunião, perguntada sobre o
assunto, Marina desconversou:
— Não li a matéria.
Diante da insistência dos jornalistas
que queriam saber se há envolvimento de políticos do PSB, apenas comentou:
— Vou ler a matéria.
Com o depoimento iniciado na
quarta-feira da semana passada, Costa deixou os procuradores com a impressão de
que o mecanismo de cobrança e partilha de propinas em contratos da Petrobras
funcionou para políticos e partidos aliados ao governo como uma espécie de
continuação do mensalão. As investigações já atingiram parlamentares da base
governista e podem respingar também na campanha do PSB. Um dos principais focos
da investigação da Polícia Federal e do Ministério Público Federal são
contratos de empreiteiras com refinaria a Abreu e Lima, em Pernambuco.
A refinaria foi o centro de uma queda
de braço entre petistas e socialistas durante a criação de duas CPIs da
Petrobras no Congresso Nacional no primeiro semestre. O PSB se opôs fortemente
à inclusão das obras da refinaria entre os alvos de uma das comissões de
inquérito.
Durante uma década, Costa foi
responsável direto por empreendimentos importantes da estatal. O maior foi o
Abreu e Lima, onde a empresa gastou nove vezes mais do que previa inicialmente
— depois de mais de uma centena de aumentos de preços nos contratos originais,
a refinaria deverá ser inaugurada a um custo estimado em US$ 20,1 bilhões,
recorde mundial no setor.
Segundo o procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, todos os nomes dos políticos mencionados por Costa
serão enviados ao Supremo Tribunal Federal (STF). O procurador-geral não quis
confirmar nomes e nem mesmo o número de políticos mencionados. Ele argumenta
que o sigilo faz parte do acordo de delação premiada, que pode ou não ser
mantido até o final da apuração das novas acusações.
— Todos os termos da delação premiada
serão encaminhados ao Supremo. Cabe ao Supremo decidir o que é e o que não é
(consistente) — disse Janot ao GLOBO.
O relator do caso no STF é o ministro
Teori Zavascki. Na primeira etapa da investigação, bem antes do início das
negociações com Costa, o ministro decidiu abrir inquérito contra os deputados
André Vargas (sem partido-PR) e Luiz Argôlo (SDD-BA) e o senador Fernando
Collor (PTB). Relatório da Polícia Federal aponta que os três receberam
vantagens da organização de Youssef. Pelas investigações da polícia, Youssef
pagou um voo em um jato para André Vargas.
O voo teria custado mais de R$ 100 mil.
Vargas teria ajudado o Labogen, um laboratório comprado por Youssef, com o
Ministério da Saúde. Argôlo já admitiu que recebeu entre R$ 180 mil e R$ 200
mil, mas negou qualquer ligação com os negócios do doleiro. Collor teria sido
agraciado com R$ 50 mil em oito parcelas. Vargas e Argôlo já estão sendo
processados por quebra de decoro.
Os depoimentos de Costa têm sido explosivos,
mas estão sendo encarados com toda reserva pelos procuradores. Ao final de cada
interrogatório, as declarações são criptografadas e guardadas num computador
sem internet. Os depoimentos começaram semana passada e ainda não há prazo para
conclusão da nova etapa da chamada Operação Lava-Jato. Segundo uma autoridade
que está à frente do caso, a cautela é necessária porque as informações são
fortes e podem comprometer o processo eleitoral.
— A eleição é daqui a um mês. Essa
investigação vai durar muito mais tempo. É um caso complexo, que exige muito
cuidado. Temos que checar todas as informações — disse o investigador, que
pediu para não ter o nome revelado.
Mas, apesar de toda preocupação, parte
das revelações começaram a vazar nesta sexta-feira. Pelo acordo de delação
premiada, o ex-diretor terá que apresentar provas ou indicar aos investigadores
os caminhos para comprovar cada uma das acusações. Segundo uma das autoridades
que está à frente do caso, só ao final da apuração será possível definir os benefícios
a serem concedidos a Costa. A redução das penas depende da comprovação das
denúncias.
Pelas investigações da Polícia Federal,
empreiteiras com contratos com a Petrobras fizeram pagamentos suspeitos ao
doleiro Alberto Youssef e a Paulo Roberto Costa a partir de transações com
empresas laranjas. Ainda na primeira fase, a Receita Federal apontou o repasse
de mais de R$ 90 milhões de empreiteiras com contratos com a refinaria Abreu e
Lima, em Pernambuco, para a MO Consultoria, empresa de Youssef, entre 2009 e
2013.
A suspeita é que, a partir daí, o
dinheiro teria abastecido campanhas eleitorais de deputados, senadores,
governadores e até de um ministro. Um dos supostos chefes da estrutura de
desvio seria Paulo Roberto. Durante as investigações, a polícia recebeu a
informação de que o ex-diretor mantinha US$ 23 milhões em 12 contas na Suíça. O
dinheiro foi bloqueado e o ex-diretor passou a ser investigado por autoridades
suíças por lavagem de dinheiro.
O deputado Fernando Francischini
(SDD-PR) vai pedir que o MP compartilhe os depoimentos do ex-diretor com a CPMI
da Petrobras. Para o deputado, as informações são essenciais para as
investigações do Congresso