Proibição de
uso de acessórios na cabeça em locais públicos divide opiniões de cariocas
FRANCISCO
EDSON ALVES
Rio - A polêmica Lei do Boné que proíbe o uso do acessório, além de
capuzes, gorros ou capacetes que possam esconder o rosto em estabelecimentos
comerciais, bancários e até condomínios, dividiu opiniões no Rio ontem, em seu
primeiro dia útil de validade. Enquanto alguns representantes das categorias
envolvidas elogiaram a iniciativa, outros a condenaram.
O objetivo da lei 6.717/2014, segundo a autora, a deputada estadual
Lucinha (PSDB), é “impedir que criminosos tentem driblar as câmeras de
segurança durante abordagens e assaltos”. “Estou atendendo a um pedido de
comerciantes”, justificou. De acordo com o texto, os vigilantes poderão pedir
para que os clientes retirem o boné para facilitar a identificação. O
descumprimento resulta em multa de R$ 500 a quem usar o acessório.
Apoio:
para Milena Fernandes, de 15 anos, que usava um gorro ontem, na entrada do
Shopping Rio Sul, medida vai trazer mais segurança Foto: Paulo Araújo /
Agência O Dia
Nas ruas, muita gente não “tirou o chapéu” para a ideia. “Eu tenho
calvície e não posso pegar sol. Então, tenho que usar este chapéu em todos os
lugares que vou. Acho essa lei desnecessária e invasiva”, protestou a
aposentada Dulce Maria, de 73 anos, na entrada do Shopping Rio Sul, em
Botafogo. “Eu acho a lei legal porque evitará muitos assaltos. Vai trazer mais
segurança”, opinou a estudante Milena Fernandes, de 15 anos.
Carlos Collor, diretor do Sindicato dos Vigilantes — categoria que está
em greve e reúne 45 mil profissionais no Rio —, adiantou que a entidade vai
tentar derrubar a lei na Justiça. “É mais uma responsabilidade incabível para o
vigilante, que terá que passar por constrangimento mandando as pessoas
retiraram acessórios da cabeça”, disse o sindicalista. Ontem, em nenhuma
entrada de estabelecimentos comerciais e bancários percorridos pelo DIA no
Centro e na Zona Sul havia placas indicativas alertando sobre a lei, conforme o
texto determina.
'Sempre uso boné e nunca me repreenderam. Mas sou contra, quero poder me
vestir como eu quiser', Bruno Metz, 31 anos, Ambientalista Foto: Paulo
Araújo / Agência O Dia
Donos de fábricas de bonés dizem que lei é ‘mais uma que não vai pegar’
Donos de fábricas de bonés se disseram indiferentes à nova lei e ainda a
ironizaram. “É o tipo de lei que não vai pegar, como a que proíbe sacolas em
supermercados”, aposta Marcelo Brito, dono da Bonés Zacavi, que fabrica mais de
10 mil peças por mês em Campo Grande.
Ênio Bittencourt, presidente da associação de lojistas da Saara, que tem
1.200 lojas no Centro, disse ser a favor da lei. “Qualquer iniciativa que vá
trazer mais segurança para os comerciantes e consumidores, é válida”, afirmou.
A direção da Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ) e do
Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes do Rio de Janeiro (SindRio), por sua
vez, preferiram, “por enquanto”, não comentar o assunto, segundo suas
assessorias. Especialista em direitos civis e do consumidor, o advogado
Marcos Cailleaux não vê inconstitucionalidade na Lei do Boné. “É o tipo de lei
em que há argumentos para os dois lados, tanto de quem é contra como de quem é
a favor. Os prós e contras vão depender de cada situação, de forma isolada”, comentou
Marcos Cailleaux.
Novo projeto aponta discriminação
Na Câmara de Vereadores, tramita o projeto de lei 794/2014, do vereador
Marcelo Piuí (PHS), contrário à Lei do Boné. Pelo texto, ele considera ato de
discriminação, violação dos direitos individuais e constrangimento, a revista
aos pertences e vestimentas, assim como a obrigatoriedade de retirada de
utensílios pessoais, como relógios, pulseiras e bonés, no ingresso a
estabelecimentos comerciais do Rio.
“A legislação estadual subverte o princípio da presunção de inocência,
prevista na Constituição, colocando todos que ingressam em estabelecimentos
comerciais com gorros ou bonés como suspeitos”, justificou Piuí, que concorda
com o professor do Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana
da UFRJ, Michel Misse. Para ele, a Lei do Boné cria constrangimento, “é absurda
e histérica”.
Já Rômulo Dlahka Tao, aficionado por rap e bonés, não escondeu sua
revolta. “É preciso que os políticos se concentrem em leis para nos trazer mais
saúde, educação e emprego. A lista de carência é enorme”, desabafou. A
Polícia Militar não informou se foi acionada ontem por conta de supostos
descumprimentos da nova lei.
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